2012/03/15

a vodka preta no filme negro

ele estava visivelmente incomodado mas, ela sabia-o bem, guardava a razão do seu desconforto só para si. tinha essa tendência. mais do que isso, tinha esse hábito: as coisas realmente importantes da sua vida, as grandes alegrias, os triunfos, particularmente nos casos de maior improbabilidade e de maiores dificuldades, mas também os desaires, os desgostos, os mais profundos medos e ansiedades.
ela sabia perfeitamente que insistir na pergunta era um erro. era-o sempre. mas, naquele momento, fê-lo. ainda hoje não sabe o que a levou a alterar o costumeiro procedimento.
- vais dizer-me o que se passa ou não? detesto ver-te assim...
- tudo se resolve... - disse ele.
de súbito, na continuação do ligeiro movimento do pescoço que fizera para a observar, levantou-se. colocou-lhe a mão esquerda sobre a boca e, auxiliado pelo peso de todo o corpo, pressionou-a contra a parede. sorriu fugazmente e perfurou-lhe os olhos (ela sempre tivera uns muito expressivos olhos cinzento-azulados) com uma navalha de ponta-e-mola.
- és um animal de hábitos, tu. - disse ela, quando ele a deixou libertar-se.
ele não respondeu, limitou-se a um leve aceno de cabeça. depois foi até ao frigorífico.

2 comentários:

antónio f. disse...

ui, está tão escuro o tempo por aqui...

me disse...

it's gonna be a bright, bright, sunshiny day...
:D :D